Com estrutura insuficiente para receber pacientes infectados das aldeias, hospital de Formoso precisa contar com a sorte de encontrar vagas no Hospital Regional de Gurupi, unidade em que morreu na quinta-feira, Juraci Javaé, o primeiro óbito da etnia por Covid-19
As precárias instalações do hospital Municipal de Formoso não comportam mais tratar de pacientes infectados por Covid-19. O hospital de referência para a região é Gurupi, mas as equipes do local precisam contar com a sorte de ter vaga no Regional de Gurupi, para enviar os pacientes que precisam de oxigênio. Na noite de quinta-feira, 9, por exemplo, não havia vaga.
O hospital de Formoso tem uma enfermaria masculina com 5 leitos, outra enfermaria feminina com mais 5 leitos e 1 enfermaria pediátrica também com 5 leitos. Com a pandemia, o pronto-socorro que tinha três enfermarias também, precisou ser improvisado para leitos Covid-19. Isolou duas enfermarias com três leitos cada para atendimento exclusivo Covid.
Dados do Distrito Sanitário Especial Indígena do Tocantins (DSEI) apontam 65 casos confirmados de Covid-19 entre os javaés que vivem em aldeias na região de Formoso do Araguaia. Outros quase 170 casos suspeitos aguardavam resultado dos exames para esta sexta-feira. Na noite de quinta-feira, houve a morte do primeiro Javaé, pela doença, um indígena de 79 anos, da Aldeia São João.
Os médicos que atuam no hospital local, discutiam o drama de ter de escolher quem deveria “deixar” um leito do hospital para abrir indígenas contaminados na noite de quinta-feira, 9. Um dos plantonistas deu o alerta no grupo que reúne os profissionais em um aplicativo.
O JTo preservou o nome dos profissionais, citados aqui por números, e divulga apenas os diálogos com interesse público.
↘ [21:58, 09/07/2020] Servidor 1: Temos que organizar isso pessoal
↘ [21:58, 09/07/2020] Servidor 1: 5 índios aqui
↘ [21:58, 09/07/2020] Servidor 1: Tudo precisaando de O2 [oxigênio]
↘ [21:59, 09/07/2020] Servidor 1: Gurupi lotado
Em seguida, no diálogo, outro profissional relata como estava sendo seu plantão.
↘ [21:59, 09/07/2020] Servidor 2: Eu falei
↘ [21:59, 09/07/2020] Servidor 1: Só nós na bagaça
↘ [21:59, 09/07/2020] Servidor 2: Toquei os dois últimos plantões com 6
↘ [21:59, 09/07/2020] Servidor 1: Tá errado
↘ [22:00, 09/07/2020] Servidor 1: E foram buscar outro ali na Canoanã [uma aldeia Javaé da Ilha do Bananal]
↘ [22:00, 09/07/2020] Servidor 2: Escolhendo um melhorzinho pra abrir uma vaga
O diálogo segue com os médicos discutindo alternativas para acudir os indígenas e revelam o temor de ter de escolher quem vai ser atendido.
↘ [22:01, 09/07/2020] Servidor3: Do jeito que tá disseminando nas aldeias tendência é só aumentar
↘ [22:01, 09/07/2020] Servidor 2: Tem que abrir uns 10 leitos
↘ [22:03, 09/07/2020] Servidor 1: **** tem que fazer hospital de campanha
↘ [22:03, 09/07/2020] Servidor 2: A saúde indígena tem muito recurso financeiro
↘ [22:03, 09/07/2020] Servidor 4: É mais fácil transformar 1 U de saúde em emergência e deixar o hospital de covidário […]
↘ [22:04, 09/07/2020] Servidor 3: Fizeram isso aqui em Canaã
↘ [22:04, 09/07/2020] Servidor 4: E que tudo relacionado à Saúde fica por conta do município
↘ [22:04, 09/07/2020] Servidor3: Questão que as unidades não têm espaço físico para isso
↘ [22:05, 09/07/2020] Servidor 2: Não vai dar conta
↘ [22:05, 09/07/2020] Servidor 3: Na minha e do @****** não tem lugar, q são duas equipes
↘ [22:05, 09/07/2020] Servidor2: Vai morrer gente na porta
↘ [22:06, 09/07/2020] Servidor 3: Na da @**** não tem nem consultório direito pra ela atender normal
↘ [22:07, 09/07/2020] Servidor 2: Vamos ter que pedir ajuda ao ministro da saúde.
↘ [22:07, 09/07/2020] Servidor 2: Quem for preciso
↘ [22:08, 09/07/2020] Servidor 2: Complicou
↘ [22:08, 09/07/2020] Servidor 3: Pra gestão o q importa é falar que vai fazer Lockdown, divulgar pros 4 ventos. Dps voltam atras e deixa tudo como está
↘ [22:09, 09/07/2020] Servidor 2: Deus nos abençoe e proteja a população
↘ [22:10, 09/07/2020] Servidor 3: A população tbm não respeita a questão de isolamento, distanciamento e higiene
Prefeitura não se manifesta
O JTo contactou a secretaria Municipal de Saúde em Formoso, mas o órgão disse que não iria se manifestar e passou o celular do assessor jurídico da pasta. O advogado João José atendeu o jornal e se desculpou por não ter autorização para falar em nome da gestão alegando que mantém apenas um contrato para prestar serviços de assessoria jurídica para a secretaria.