Especialista alerta para necessidade de investimentos regulares em segurança prisional após fuga inédita em penitenciária de segurança máxima.
É preciso garantir recursos financeiros regularmente para penitenciárias, para que não aconteça a fuga de presos, como ocorreu na penitenciária federal de Mossoró, localizada no oeste do Rio Grande do Norte; aponta Francisco Augusto de Araújo, coordenador da Rede de Apoio a Egressos do Sistema Prisional do Rio Grande do Norte (Raesp – RN) e vice-coordenador da rede nacional (Renaesp). Esta foi a primeira vez em que detentos conseguiram escapar de uma das cinco penitenciárias de segurança máxima do país.
“Essa é uma oportunidade que nós temos de pensar um plano de investimento nessas unidades prisionais, saber como é que vão fazer um levantamento sobre todas as outras unidades prisionais, saber que tipo de precarização já está acontecendo e que não é de hoje. Essa precarização se revelou e mostrou a fragilidade das unidades prisionais, dessa em especial, e que muito provavelmente, outras unidades prisionais federais também estão nas mesmas condições estruturais”, ressalta Araújo.
Para o coordenador, as penitenciárias federais devem ser mantidas sem nenhum tipo de flexibilização de orçamentos, porque apesar do custo ser alto, ele é necessário porque os presos nesses locais vêm de grandes lideranças de organizações criminosas ou cometeram crimes de alta comoção nacional, e por isso, precisam estar isoladas para garantir a vida de outras pessoas e a própria vida.
Araújo relembra que, em 2017, um grupo de alunos privados de liberdade da penitenciária federal de Mossoró foi aprovado em um curso de educação a distância. Nessa época, ele foi convidado para fazer a articulação entre a instituição de ensino e a prisional.
“Eu atuei na penitenciária federal de Mossoró em 2017 e em 2018. Os critérios de segurança eram altíssimos. Eu não vi nenhum tipo de flexibilização, de relativização dos protocolos de segurança, muito pelo contrário. Desde a portaria a gente já passa por detectores de metais. A gente leva o material impresso, apostilas para os alunos, tudo é colado, tudo é carimbado, tudo enumerado, nada é grampeado, nada é encadernado. E tudo isso ainda passa por uma esteira, no modelo de um aeroporto”, explica.
O coordenador informa que as penitenciárias federais são feitas para que não existam possibilidades de fuga, já que são presídios de isolamento e não de cumprimento de pena, ou seja, posteriormente, os presos irão retornar para o sistema penitenciário estadual.
De acordo com o último levantamento realizado pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), em junho de 2023 foram registrados 644.305 presos em celas físicas estaduais, 489 em federais e 4.798 presos em carceragens de Polícia Civil, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros Militares e da Polícia Federal no Brasil. Além disso, havia 190.080 pessoas em prisão domiciliar.
Ainda segundo a Secretaria, no mesmo período, foram registradas 757.277 incidências, incluindo crimes como tortura, disparo de armas de fogo, extorsão, furto, homicídio e latrocínio.
A fuga de dois presos da penitenciária federal de Mossoró pode ter colocado em xeque os protocolos de segurança no sistema penitenciário federal, aponta o advogado criminalista Rafael Paiva.
“O que nós esperamos de um sistema penitenciário é que ele cumpra o seu papel, que é de impedir que haja um fugas. Então se houve uma fuga de presos condenados, extremamente perigosos, nós temos sim que olhar para esse sistema de segurança, protocolos de segurança e verificar o que pode ter acontecido”, explica.
Para Paiva, o sistema penitenciário brasileiro precisa de uma reforma, não só na lei de execuções penais, como também na estrutura dos presídios e administrações deles.
“Nós precisamos pensar em uma reforma do sistema prisional como um todo, não só estrutural, mas também é na forma como nós enxergamos esse problema, que é um problema que existe em qualquer país grande. Existe no Brasil, também existe nos Estados Unidos, mas nós precisamos buscar melhorias, olhar para outras experiências e verificar quais delas poderiam ser aplicadas no Brasil para termos um sistema prisional melhor”, ressalta.
De acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, cerca de 300 agentes estão envolvidos nessa operação, composta por membros da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e forças estaduais. O alerta vermelho da Interpol também foi acionado. Além disso, três helicópteros e drones estão sendo utilizados nas atividades de busca.
A Pasta solicitará a nomeação de 80 policiais penais federais, que já foram aprovados em concurso público, para aprimorar o sistema penitenciário federal. Conforme afirmado pelo ministro, uma parcela desse contingente será designada para atuar na unidade de Mossoró.
Além disso, há duas investigações em curso. Segundo o Ministério, uma delas, de caráter administrativo, vai apurar as responsabilidades relacionadas à fuga, podendo resultar em um processo administrativo. Também há um inquérito no âmbito da Polícia Federal, instaurado para investigar possíveis responsabilidades criminais daqueles que eventualmente facilitaram a fuga dos detentos da penitenciária.
Nesta terça-feira (20), a corregedora do sistema prisional, Marlene Inês da Rosa, ordenou o afastamento de quatro diretores encarregados das áreas de segurança, inteligência e administração no presídio federal de Mossoró. Conforme a determinação, esses funcionários manterão suas funções como agentes penais, porém sem ocupar cargos de chefia nos respectivos setores.
Fugitivos
Um dos fugitivos se chama Rogério da Silva Mendonça, conhecido como Querubin. Ele enfrenta uma sentença de 74 anos de prisão. Com a idade de 35 anos, está sujeito a mais de 50 processos, abrangendo acusações de homicídio e furto.
Já o segundo, Deibson Cabral Nascimento, conhecido como Tatu ou Deisinho, está vinculado a mais de 30 processos, abrangendo acusações de roubo, tráfico de drogas e associação com organizações criminosas. Ele foi condenado a uma pena de 81 anos de prisão.